24 abril 2011

Uma reflexão de Páscoa

A Paz de Cristo irmãos!

Um dia participei de um retiro que buscava fazer os retirante percorrer os caminhos dos discípulos de Jesus durante a sua paixão. Naquele momento, algo me chamou bastante atenção. Me pareceu mais compreensível o sofrimento dos seus discípulos e as atitudes que eles tiveram perante a prisão e a morte de Jesus, mas me identifico muito com o que um bom amigo me disse uma vez, que  "Jesus é como o sol. Nos colocamos na sua presença e sem percebermos, Ele nos transforma, nos queima, nos muda, nos faz novos, mesmo sem conseguirmos explicar ou entender como isso aconteceu."

Hoje creio entender um pouco mais do que antes aqueles sentimentos. Fico imaginando Pedro por exemplo e o quanto deve ter sofrido ao negar Jesus. Mas também fico imaginando como era difícil e confuso entender aquele Jesus. Todos os judeus, e Pedro, conseqüentemente também por ser judeu, esperavam um Messias rei, poderoso, que os arrancasse das mãos dos inimigos e instituísse o reino de paz e de justiça para aquele povo tão maltratado.

Estava claro para Pedro que Jesus era esse Messias, tanto que em outra ocasião Pedro havia declarado que Jesus era o Messias, o Filho do Deus Vivo e que somente Ele tinha palavras de salvação. Mas como entender agora, que o Jesus, o Messias, o Filho do Deus Vivo esteja preso e sendo condenado a morte? Como é possível imaginar o filho do Deus da Vida condenado à morte?

Imagino Pedro pegando sua espada no Monte das Oliveiras para defender a Jesus crente e certo de que o poder de Deus viria do alto assim como tantas vezes ocorreu na história de seu povo. Poder que o próprio Pedro vira tantas vezes antes ser demonstrado por aquele Jesus. Mas NÃO. O que Pedro via agora era um Homem que conscientemente e o que é mais incompreensível, sem lutar, se entrega aos soldados e pede para que os mesmos deixem os seus discípulos partirem.

Creio que o coração daquele homem ainda estava em brasa, desesperado, buscando de qualquer forma uma resposta, uma compreensão. O que aquele Jesus queria? E que história seria aquela de que o Filho do Homem haveria de morrer e ressurgir no terceiro dia? Isso não faz sentido algum.

O pescador rude, que a princípio desafiara a Jesus naquela noite de pescaria improdutiva, mas que ao conviver com o Mestre abrandara seu coração, me parece se sentir novamente confuso. Imagino a dor em seu coração durante o seu choro de arrependimento por ter negado a seu Mestre. Como deve ter sido perturbador pensar que a seu modo e do seu jeito, ele, o homem pedra a quem Jesus um dia confiara a sua Igreja, também o traíra.

Por outro lado, como entender que aquele Jesus que agora sofria e era condenado, soubera mais uma vez dizer o que ele Pedro faria e até mesmo o momento em que ele o negaria?

Imagino também o sofrimento e decepção daqueles que quiseram um dia sentar à direita e à esquerda de Jesus no Reino que ele haveria de preparar. As vezes fico pensando o que será que passou em suas mentes quando viram Jesus, o seu mestre, pregado ali na cruz.

Também os discípulos que voltavam para Emaús, quanta tristeza e talvez até vergonha não havia em seus corações. Fivo imaginando às vezes que eles voltavam para suas casas como quem sai em busca de uma aventura e "quebra a cara". Tristes, abatidos, sofridos e mais uma vez desenganados. Parece que Deus estava pregando uma peça naquele povo. Tantos falsos profetas e agora este que tinha tudo para ser o verdadeiro Messias estava morto. Eram suas próprias esperanças que caiam naquele deserto em forma de lágrimas e suor. Eram suas tristezas que eram entregues àquele viajante na estrada para Emaús. E a noite chegava aos seus corações como que um selo de amargura fechando definitivamente seus corações à esperança.
Não falam a respeito da família daqueles homens, mas creio que eles tinham famílias, e mesmo que não o tivessem, imagino toda a cidade (e quem mora ou já morou em cidade pequena sabe o que estou falando) zombando deles porque haviam saído em busca de um falso Messias. Sim, um falso Messias, pois acredito que no coração daqueles homens devem ter pairado muitas dúvidas.

Pouco se fala a respeito, mas mesmo Judas, o traidor, diz a palavra que se arrependeu de haver traído seu Mestre e também diz a palavra que ele o fez sob a ação de um demônio. Após passar este momento de fraqueza, quão forte deve ter sido a dor em seu coração por ter traído o seu Mestre. Mas creio que forte também foi o medo de nunca poder ser redimido de seu pecado. Ele fora responsável pela morte do Filho de Deus e não tinha a chance de ao menos implorar o perdão daquele Homem maravilhoso que se estivesse vivo com certeza o perdoaria.

Sem o perdão de seu tremendo pecado e sem crer na misericórdia de seu Mestre, vai e comete o maior de seus pecados, se matando. O remorso é maior que a marca do amor colocada em seu peito e ele se mata.
Penso muito também sobre Maria. A Mãe do Cristo, que também creio que não compreendia o que acontecia a seu redor. Parece que a vejo lembrando da voz do anjo que dizia, que de seu ventre, sairia o Filho de Deus. Ela sabia e tinha plena certeza de que aquele era o Filho de Deus. Havia saído dela. Ela sabia que Ele havia sido concebido por obra do Espírito Santo de Deus. Em seu coração ela guardava todas as coisas como nos diz a palavra de Deus, mas quanta dor ao ver seu filho sendo surrado sem ter cometido crime algum.

Creio que a dúvida no coração de Maria era diferente da que havia no coração dos discípulos. A eles cabia duvidar se era realmente Aquele o Messias que havia de vir, mas a Maria não cabia esta dúvida. Ela era Sua mãe. Ela tinha recebido o anuncio do anjo, tinha concebido através da obra do Espírito Santo e havia dado à luz Jesus, sendo virgem. No entanto, creio que duas dúvidas pairavam em seu coração:
- Porque sendo Ele, Deus, aceitava tudo aquilo de forma tão humana e ao mesmo tempo tão serena?
- Como haveria de ser a sua vitória sobre o seu opressor? Quando tudo aquilo acabaria?

Fico imaginando que a cada novo acontecimento, Maria pensava, será agora Senhor? A cada novo açoite, a cada cusparada, seu coração doía mas também pensava:
- É agora que eles entenderão?
- É agora meu filho?
- É agora que Deus tocará os corações destes homens?

Mas isso não aconteceu. Ferimento após ferimento. Dor após dor. Escárnio após escárnio. Cusparada após cusparada. Espinho após espinho. Cravo após cravo e até a lança e o Fim, Deus não se manifestou.

O cordeiro foi imolado. Pronto! Tudo consumado! Seu filho está morto e com ele a esperança de todo o povo de Deus. O que restou de seu filho, do Filho de Deus, um corpo morto, frio, sem vida.

Este é o momento em que não consigo imaginar o que se passou no coração daquela mãe. Como equilibrar a certeza de que Aquele era o Filho de Deus e a certeza de que estava morto? Não havia dúvidas de sua morte. Jesus morrera e estava estendido em seus braços. Não era um simbolismo e nem mais uma das parábolas que ele contava para ensinar o povo. Era real. Era o seu corpo estendido nos braços de sua mãe. O corpo que um dia ela embalou agora jazia sem vida em suas mãos. Será que em seu coração passou a idéia de que Deus, o Deus de seus pais, o Deus único e todo poderoso havia sido derrotado pelos opressores ou o Espírito Santo de Deus a preservou de tais dúvidas?

De qualquer forma, as perguntas devem ter se mantido em seu coração.

Creio que a cruz foi motivo de medo, decepção, descrença e desanimo para todos, mas mais do que isso, acredito que a cruz foi um local de esvaziamento para preparar o que estava por vir.

Para Deus, esvaziamento de sí mesmo, total igualdade com a condição humana, total conhecimento de nossas fraquesas. "Meu Senhor, despojou-se de Sí sendo Deus, se fez homem, se humilhou e morreu numa cruz".

Para os discípulos e para Maria, esvaziamento das certezas que o mundo, a história lhes haviam trazido. Era preciso se esvaziar das falsas certezas para que o Espírito Santo pudesse ensiná-los e preenchê-los com a certeza de um reino muito maior, um reino de um Rei que liberta de dentro para forma, que liberta as almas dos cativos de forma a produzir homens verdadeiramente livres.

Para nós que vivemos nos dias de hoje, esvaziamento de nossas buscas, de nossos planos e certezas, do nosso egoísmo e da cultura de que somos donos de nós mesmos e que, algo só é bom se é bom pra mim. Ao olharmos a cruz ela mostra um Deus que amando aos seus se entregou por amor. Mostra um Deus que não pensou no que era melhor para Si e nem no que era mais cômodo, mas pensou sim em salvar os seus, pensou no amor, pensou na compaixão.

Ao olharmos a cruz, vemos um Deus carinhoso, forte pois suportou toda a dor e a indiferença por amor aos seus. Mesmo não tendo pecado algum, se fez pecado por nós e nos deu a vida eterna.

Para muitos ainda hoje (e cada dia mais), a cruz é sinal de contradição, de fraqueza e de horror. A cruz é sinal de sofrimento, de esvaziamento e de passagem. Não queremos sofrer, queremos uma fé de delícias, uma fé que nos traga tudo o que há de bom dos céus e que nos aliene do que acontece ao nosso lado. Não aceitamos o sofrimento, estamos acostumados à vitória e a humilhar para não sermos humilhados. Ser vencidos, Jamais, e o que Jesus vem ensinar hoje não é isso, a vitória na fé não se conquista assim.
Jesus é vencedor e só nele somos vencedores, mas sua vitória é diferente, é vitória que trás frutos, é vitória para todos e não somente uma vitória pessoal.

A força de Cristo não está em usar o seu poder para evitar o sofrimento, mas sim em, sendo Deus e tendo poder para evitar o sofrimento e aniquilar todos os que lhe maltratavam, resignar-se e sofrer tudo em silêncio. É o poder de estar sendo preso e encontrar tempo para repreender Pedro que fere seu agressor e curar aquele homem antes de ser levado por seus amigos para ser morto pelos pecados do mundo. A força de Cristo está em sendo Deus, cair três vezes no caminho para saber o que se sente ao cair. Perder amigos para a morte para saber o que se sente ao perder o que se ama. Ter seu corpo dilacerado para saber o que se sente ao ser condenado injustamente e vencer a todas estas coisas, para Vivo, ser capaz de nos compreender e ajudar na caminhada.

Antes do domingo de páscoa esta reflexão terminava aqui, mas Deus sempre quer mais e nos leva além.
Na missa da Vigília Pascal Deus me trouxe à mente estes dois trechos do filme "Jesus de Nazaré" que deixo aqui para que possam ver.

http://www.youtube.com/watch?v=clv9P1BCjOI

http://www.youtube.com/watch?v=6GKPy-CJk4M&feature=related



Como é belo ver que mesmo no meio de toda a dúvida, de toda a incerteza, de tudo o que acontecera com aqueles discípulos eles conseguem crer. Como é belo ver que o impulso da fé traz vida àqueles corações e ressurreição é vivida de verdade por aqueles homens. É belo ver Pedro fazendo sua primeira pregação e convertendo uma multidão de pessoas, é belo ver Cristo partindo o pão para os discípulos de Emaús e rasgando o selo de tristeza e de dor que aquela noite colocava sobre seus corações. É lindo e maravilhoso ver o véu do templo sendo rasgado no coração de cada um daqueles homens e mulheres e os mistérios da fé sendo revelados aos seus corações pelo fogo do Espírito Santo de Deus e pela presença vivificadora do Cristo ressuscitado.

Já não há mais dúvidas nem medos. Não há mais parte incompreendidas em meio a tudo aquilo que o Mestre falava. Não há mais o medo de ter seguido um falso Messias nem de ter acreditado num aventureiro. Somente o que resta é a certeza de que aquele é realmente o Filho de Deus, o Messias e que nem mesmo a morte o pode segurar. Como disse Pedro, "o que sabemos é que aquele Cristo que vocês crucificaram ressurgiu dos mortos e apareceu para nós e disso damos testemunho porque é a verdade".

Lembremo-nos irmãos, JESUS RESSUSCITOU!!!
Mesmo depois de toda decepção, mesmo depois do medo, mesmo depois da morte, mesmo depois de visitar o inferno, mesmo depois de tudo isso, CRISTO RESSUSCITOU!!!
Nada mais tem poder sobre nossa vida pois O MESSIAS ESTÁ VIVO!!!
A morte, a tristeza, a enfermidade, o desemprego, a humilhação, a dúvida, o medo, a incerteza, o desamor, a guerra, nada disso tem mais poder sobre nós, porque O FILHO DE DEUS NOS DEU NOVA VIDA!!!
Bendito pecado original que tão grande graça e tão grande compaixão mereceu.
Obrigado Jesus, pois sendo Deus de Deus, se fez homem e sendo homem desceu até os mais profundos dos infernos onde nos encontrou e nos salvou neste dia.

ALEGRIA IRMÃOS!!!
O Pai cumpriu sua promessa. Jesus está vivo!!!
A cruz não o deteve!!! A morte não teve a palavra final sobre a vida do Filho de Deus e graças a Ele, não tem a palavra final sobre a nossa vida também!!!

Que essa páscoa nos ensine a sermos como Jesus e a não termos medo da cruz, e que ela faça conosco o que fez com o povo do tempo de Cristo. Que nos esvazie de nossas certezas e de nossos "poderes" para que o verdadeiro poder, o poder de Cristo possa fazer morada em nós e para que possamos dizer como Paulo: "Eu morri na cruz com Cristo. Já não sou eu quem vivo, mas é Cristo quem vive em mim".

Tenhamos todos um santo e feliz tempo Pascal e que a alegria do Cristo Ressuscitado seja a nossa força!